O deputado bolsonarista pelo estado de Santa Catarina, Hélio da Costa, viralizou nas redes sociais depois de insistir que o Mato Grosso do Sul fazia parte da região Sul, junto com Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Não demorou muito para os usuários fazerem paralelos com outros casos de analfabetismo geográfico da classe política brasileira.

Mas o que pode parecer uma simples gafe ou falta de conhecimentos geográficos de nossos políticos, em alguns casos, representa uma estratégia para afirmar alguma posição em relação a um determinado assunto utilizando-se de informações falsas, as famosas fake news.

Assim como a pesquisa de dados e fatos históricos para atestar a veracidade de uma notícia é imprescindível nos dias de hoje, também é fundamental ter conhecimento de informações geográficas. Veremos alguns exemplos.

O analfabetismo geográfico com cunho político

Em junho de 2020, na tentativa de minimizar o aumento do número de casos de coronavírus nas regiões Norte e Nordeste, o então ministro interino da saúde, general Pazuello, afirmou que o pior já havia passado, já que essas regiões por estarem no hemisfério Norte, enfrentaram uma alta dos casos devido o inverno.

O Brasil possui apenas 7% de seu território no Hemisfério Norte e a região Nordeste não está nele. A região Norte que tem uma pequena parcela de suas terras neste Hemisfério, não tem como característica em seu clima baixas temperaturas.

O chamado “inverno Amazônico” de dezembro a maio, é um período de maior nebulosidade e chuvas, o que reduz o calor, mas não o suficiente para causar um aumento na disseminação do coronavírus.

Somente esta fala já seria o suficiente para o então ministro interino ser desqualificado para o cargo, algo que não ocorreu. O analfabetismo geográfico que havia sido utilizado como oportunismo, passou a prejudicar vidas!

Em fevereiro de 2021, o Ministério da Saúde agora sob o comando do general Pazuello, especialista em logística, enviou uma remessa de 78 mil doses de vacina para o Amapá e somente 2 mil para o Amazonas, estado que em apenas dois meses havia dobrado o número de mortes em relação ao ano de 2020.

A confusão do Ministério “técnico” foi a troca das siglas AM (Amazonas) por AP (Amapá), necessitando de um novo frete para reparar o erro, o que na prática, significa mais desperdício de dinheiro público e o atraso na vacinação. Um erro que pode ter custado vidas.

Amazônia ou Mata Atlântica?

Em setembro de 2020, aumentaram as pressões nacionais e internacionais a respeito do desmatamento e das queimadas na Amazônia, evidenciada principalmente por pesquisas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Não contente com os resultados, o governo provocou a demissão do diretor do INPE Ricardo Galvão, em uma inédita desqualificação das pesquisas do Instituto.

Na tentativa de também usar o analfabetismo geográfico para contestar as queimadas na Amazônia, o então Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e o vice-presidente General Hamilton Mourão, publicaram em suas redes sociais um vídeo produzido pela Associação de Criadores do Pará (ACIRPA) para tentar provar o contrário do que muitos já sabiam.

O vídeo, que exibe uma compilação de imagens de floresta, animais e povos indígenas, e mostra em uma de suas cenas um mico-leão-dourado, animal típico da Mata Atlântica. Em uma tentativa clara de enganar a população brasileira e a comunidade internacional, esqueceram-se de considerar as diferenças biogeográficas entre estes biomas.

Cena do vídeo feito pela ACIRPA e divulgado pelo ex-Ministro Ricardo Salles e o Vice-Presidente Hamilton Mourão.

Ainda na tentativa de provar que não haviam queimadas na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro propôs sobrevoar a floresta junto a diplomatas.

Acontece que a floresta Amazônica abrange mais de 40% do território brasileiro, e possui uma dimensão que equivale ao tamanho da Europa Ocidental. Dependendo do trajeto, os focos de incêndio, por maiores que fossem, poderiam ser evitados dada a imensidão da floresta.

Neste caso, o tamanho da Amazônia foi negligenciado para ser utilizado em sua possível tentativa de enganar diplomatas de outros países. Quando foi de sua conveniência para justificar a dificuldade em fiscalizar a Amazônia, Bolsonaro se utilizou do tamanho da floresta, mas de maneira errada, dizendo que ela é maior que toda a Europa.

Ao esquecer de regionalizar a Europa, Bolsonaro cometeu um erro em sua comparação, já que a floresta é 59% menor que o continente todo, considerando sua porção Ocidental e Oriental.

Outro caso envolvendo a Amazônia foi a da vereadora de Taubaté, Vivi da Rádio, que havia dito que os casos no estado do Amazonas estavam altos por este estado ser próximo de Miami na Flórida, e que a atração de turistas desta cidade nos Estados Unidos seria o responsável.

Para a vereadora, não foi a má administração da pandemia pelo governo do estado do Amazonas e a ineficiência do Ministério da Saúde os responsáveis pelo aumento nos casos e mortes. A culpa foi da “proximidade” com Miami, uma cidade distante 3875 km de Manaus.

O despreparo político

Estes foram apenas alguns casos para ilustrar como o analfabetismo geográfico pode aparecer como uma tentativa de justificar as ações, atitudes e erros cometidos por alguns governantes.

O que parecem simples gafes, podem estar carregadas de cunho político eleitoreiro, para manipular as massas de manobra e seguir com o projeto político. Algumas outras falas como a do deputado Hélio da Costa e mesmo algumas falas de Bolsonaro, como o da Antártica fazer parte do Brasil, só mostram o quanto nossos políticos estão despreparados para o cargo que exercem.

Mas todo esse despreparo também deve acender um sinal de alerta em nossa sociedade, já que vivemos em uma democracia representativa, onde os políticos eleitos refletem o grau de educação daqueles que o elegeram.

Enquanto a crise na educação continuar a ser um projeto, a população continuará sujeita às armadilhas e distorções que sofrem não somente a Geografia, mas todas as áreas do conhecimento quando necessárias aos argumentos e justificativas de um governo que não se preocupa com a verdade.

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