Possuir identidade é ter poder. Com base nessa ideia, o governo da Coreia do Sul, em parceria com empresários do ramo do entretenimento, vem aumentando, nas últimas décadas, a sua produção de bens de cultura pop em larga escala.

No século XXI, era de esplendor da Globalização, essa nova produção de cultura pop sul-coreana vem sofrendo um gradativo crescimento na exportação dos produtos ao redor do mundo, penetrando, além da Ásia, países americanos e europeus, transformando-se num verdadeiro fenômeno de viralização global.

Este fenômeno visa alcançar o maior número de países, principalmente ganhar notoriedade no Ocidente. Por isso, a indústria e o governo valeram-se da prática do soft power e de estratégias híbridas através do fenômeno Hallyu – em português, “Onda Coreana” – a fim de promover a Coreia do Sul por meio da expansão dos bens culturais nas mais diversas formas, mediado em grande medida pelo surgimento de movimentos de propagação via fandom.

Na contemporaneidade, a Onda Coreana abrange inúmeros produtos culturais, dentre os quais o K-pop é um deles, juntamente com os K-dramas (os famosos doramas ou dramas coreanos) e a K-beauty. Ficou curioso (a)? Vem entender a estratégia do soft power e o avanço da indústria cultural sul-coreana comigo!

O fenômeno da expansão global Hallyu

Todo mundo sabe o potencial da Coreia do Sul quando se fala em tecnologia, indústria automobilística e construção naval. Não é à toa que o país é conhecido como um dos Tigres Asiáticos (ao lado de Cingapura, Hong Kong e Taiwan), justamente em função do rápido crescimento econômico baseado no modelo exportador de eletrônicos e veículos.

Por outro lado, na tentativa de promover esse mesmo reconhecimento só que no aspecto cultural, a Coreia do Sul investiu em um novo fenômeno de popularização cultural. Trata-se da Hallyu, uma estratégia mercadológica própria ligada ao desenvolvimento de uma identidade cultural que facilita o reconhecimento internacional e a aproximação dos fãs de diferentes culturas.

Criada oficialmente na década de 1990, a Onda Coreana vem se destacando no cenário internacional não apenas por ter impulsionado economicamente e significativamente a cultura do país austral da península coreana, mas também por quebrar com os preceitos de homogeneização do mundo, sobretudo pela influência hegemônica dos Estados Unidos.

Não só a Hallyu, outros fenômenos também nascem para formar sua própria identidade, como, por exemplo, a indústria cinematográfica indiana (Bollywood), que produz anualmente mais filmes que Hollywood.

A Hallyu surge da proposta de superar um extenso histórico sombrio de participação em guerras e disputas de territórios que ocasionou à Coreia do Sul uma instabilidade financeira, o que provocou uma percepção externa negativa, por muito tempo intrínseca ao país. Assim, a idealização do fenômeno Hallyu significou (e representa até hoje) uma importante fonte de mudança nas relações políticas e financeiras do país ao redor do mundo.

O termo Hallyu, como uma expressão nova, surgiu pela primeira vez em 1997, na mídia chinesa, a fim de nomear a crescente popularização dos K-dramas na China, à época, um dos principais consumidores das produções sul-coreanas. Existem várias versões de como o termo foi incorporado como sinônimo da expansão global de séries provindas da Coreia do Sul.

Uma delas é a mais conhecida pelos fandoms e que vem sendo trabalhada pelos estudiosos da cultura pop sul-coreana que considera que, embora não tenha uma tradução literal, a expressão Hallyu ficou mundialmente conhecida por significar “Onda Coreana” ou “Fluxo da Coreia”, em razão da rápida aceleração no consumo das séries na China.

Ao longo dos anos – o que antes nem sequer existia – com a difusão das séries, a cultura pop da Coreia expandiu-se para os demais países do continente asiático, até chegar às terras Ocidentais. E junto, o significado do termo como o fenômeno de popularização das séries passou a envolver toda produção de bens de cultura pop direcionadas à exportação.

Isso implica no fato de que para um produto entrar na Hallyu é necessário o seu estabelecimento internacional, pois essa nova identidade cultural é tida como uma estratégia de conquista mercadológica e comunicacional baseada nos preceitos do soft power.

A estratégia do soft power

O soft power é nada mais nada menos que a habilidade de conseguir o que se quer pela atração e não pela coerção ou pagamentos. Surge, portanto, da atratividade de um país por meio de sua cultura, de sua política e de seus ideais. Nesta estratégia, a sedução é mais efetiva que o poder coercitivo, podendo ser utilizado em diversos aspectos no mundo: em questões políticas, diplomáticas, econômicas e culturais.

A Coreia do Sul adota esse tipo de força da seguinte forma: permeia o desenvolvimento criativo dos produtos que fazem parte do fenômeno Hallyu e, a partir disso, utiliza o apelo das produções culturais em favor da melhoria nas relações internacionais, de modo suave, persuasivo e fluido, e não de maneira brutal e impositiva.

A estratégia foi criada a fim de exteriorizar e construir uma cultura de mercado representativa capaz de explorar a imagem, a partir de aspectos visuais e sonoros provindos de avanços da tecnologia.

No caso da Onda Coreana, são produtos comerciais que estão interessados não apenas em gerar lucro, mas também em construir marcas identificatórias, desconstruir preceitos pré-estabelecidos e reinventar os códigos da sociedade sul-coreana contemporânea, seja na perspectiva do olhar estrangeiro seja do olhar local. Aí entra em cena o K-pop – não como algo ligado apenas à música, mas que contribui para difundir a cultura oriental.

Como o K-pop fortalece o soft power sul-coreano?

A inserção do K-pop se caracteriza como uma estratégia de soft power. O objetivo é disseminar a cultura, a educação e o idioma, a fim de influenciar ou despertar o interesse dos fãs estrangeiros. Essas estratégias tiveram sucesso pelo fato de grandes empresas de entretenimento investirem na produção e promoção da música folclórica K-pop e de romances e filmes sul-coreanos, que se tornaram populares em todo o mundo.

O termo K-pop corresponde a uma abreviação de “Korean Pop” (em português, pop coreano) e designa a música popular como um todo, podendo misturar estilos como hip hop, dance music e rock.

A expansão desse produto cultural sul-coreano foi apoiada, como já dito, pelo soft power. Em vista disso, nos anos 1990 a criação de políticas externas sul-coreanas deu início a uma série de interações culturais no âmbito continental e, posteriormente, global.

E foi assim que o K-pop começou a emergir. Hoje, mais que um estilo de música, o K-pop assume dimensões econômicas.

Para se ter uma ideia, os US$ 4,7 bilhões registrados em vendas no ano de 2017, fez com que a indústria musical da Coreia do Sul ocupasse a 6° posição no mundo em 2018.

E não para por aí! Só o grupo sul-coreano Bangtan Sonyeondan (BTS) – em português, Meninos à Prova de Balas -, símbolo do gênero, tem uma arrecadação anual de mais de US$ 3,6 bilhões. Com dois álbuns na lista dos dez mais ouvidos – Love Yourself Answer e Love Yourself Tear -, a boy band com sete integrantes foi o segundo grupo que mais vendeu em 2018.

BTS na capa da revista TIME. 
Da esquerda para a direita: V, Suga, Jin, Jungkook, RM, Jimin, J-Hope (Foto: Reprodução da Internet).

Sem contar o incremento no turismo local que é resultante da ascensão da banda. As exportações associadas ao BTS (de roupas, cosméticos ou produtos alimentícios) são responsáveis por mais de US$ 1 milhão em lucros.

Nesse sentido, observa-se que o uso do soft power na Coreia do Sul através do fenômeno Hallyu e da consequente propagação do K-pop representa uma força que desponta não apenas para revitalizar a produção da indústria cultural do país, mas também o modo pelo qual a conquista do fã, seus comportamentos organizacionais e de interação inferem na difusão comunicacional no mundo globalizado e interconectado.

Isso faz com que a exportação do soft power coreano seja convertida numa fonte de inspiração para outros países bem como propicia à Coreia do Sul bons resultados em diversos setores, sendo conhecida – de fato – como “o país do soft power”.

Referências

ALMEIDA, N. B. de. O fenômeno Hallyu e as práticas interacionais dos fãs brasileiros no contexto do processo do soft power da Coreia do Sul. 2019. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2019.

Coreia do Sul, de Tigre Asiático ao País do Soft Power – Revista Arco (UFSM): https://www.ufsm.br/midias/arco/k-pop/

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