Adriano Imperador Favela

O lugar para a Geografia pode ser definido nas palavras da geógrafa e professora da USP Ana Fani Alessandri Carlos, como o “espaço apropriado para a vida” ou o “espaço a ser sentido, pensado, apropriado e vivido através do corpo”.

A história do jogador Adriano, ídolo do Flamengo e do time italiano Inter de Milão (onde recebeu o apelido de Imperador), exprime muito bem esse conceito. No auge de sua carreira na Itália, o jogador nascido na Vila Cruzeiro, uma das favelas mais violentas do Rio de Janeiro, retorna as suas origens, ao seu lugar, levantando uma série de especulações negativas a seu respeito.

A trajetória de Adriano não segue o script defendido pelo sistema, aquele de que a favela deve ser o lugar de saída e não de chegada. Não é comum vermos um jogador de sucesso na Europa deixar de lado a fama e um salário milionário para retornar a favela, espaço segregado e estereotipado por uma parcela da sociedade com conotações fortemente pejorativas.

Adriano Imperador na Vila Cruzeiro.

Em recente entrevista a revista The Players Tribune (11 de maio de 2021), o ex-jogador se abre a respeito de sua tão questionada volta ao Brasil. O retorno de Adriano ao seu lugar, rompe com o paradigma de “sair da favela” e na tentativa de desmoralizar sua decisão, o jogador foi bombardeado por notícias sensacionalistas que o associavam ao tráfico e ao uso de drogas. Afinal, é só na favela que acontece isso não é mesmo? (contém ironia)

Na entrevista Adriano relembra carinhosamente o trajeto que fazia com sua avó até o centro de treinamento do Flamengo, lembrança esta que remete ao lugar para a Geografia, já que este conceito segundo as palavras de Ana Fani se refere também ao “cotidiano e a seu modo de vida, onde se locomove, trabalha, passeia, flana, isto é, pelas formas através das quais o homem se apropria e que vão ganhando o significado dado pelo uso”.

Em uma sociedade onde a ostentação e a individualidade se fazem cada vez mais presentes, é incompreensível que alguém abandone o luxo para voltar a favela. Sem romantiza-la, Adriano reconhece que há em seu lugar dor e miséria, mas fica evidente em sua fala que essas dificuldades de maneira dialética estreitam os laços entre os indivíduos que nela vivem, criando formas de solidariedade, o senso de comunidade e o sentimento de pertencimento a um lugar.

Quando penso em como foi crescer na favela, eu me lembro, na verdade, de como a gente se divertiu. Joguei bola de gude, empinei pipa, soltei pião…
(…) Eu estava cercado pela minha família, pelo meu povo. Eu cresci na comunidade. Eu tinha liberdade. Eu não sofri. Eu estava vivendo, aprendendo com a vida.
(…)Ganhei muito dinheiro na minha carreira. Mas quanto dinheiro você pagaria para se divertir de novo?

Adriano a revista The Players Tribune

O lugar é um espaço subjetivo. Cada um tem o seu! Esse conceito talvez seja um dos mais importantes da Geografia e enquanto ele não for compreendido em sua essência, também não será compreendida a decisão de Adriano, que como disse em entrevista, apenas voltou para casa, ou seja, para o seu lugar.

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